Em Canindé, o mês de outubro chega carregado de uma energia única, uma mistura inebriante de fervor religioso e tensão política. As eleições e os festejos de São Francisco, que sempre coincidem, dão à cidade um ar de urgência, como se o destino da fé e da política se encontrassem em cada esquina.
As ruas, geralmente tranquilas, fervilham com a multidão. Romeiros de toda parte caminham lado a lado com eleitores decididos, como se ambos peregrinassem rumo a promessas — os primeiros, de milagres; os segundos, de mudanças. O pó da estrada levanta com as procissões e as carreatas dos candidatos, formando uma espécie de nuvem mística e ao mesmo tempo caótica, onde rezas e jingles eleitorais se entrelaçam.
Na praça da Basílica, o clima é de devoção. Velas acesas, promessas murmuradas ao pé da estátua de São Francisco, lágrimas que correm discretas pelos rostos cansados de quem veio de longe, carregando a fé como única bagagem. Do lado de fora, porém, é o outro espetáculo que atrai: carros de som, bandeiras agitadas, e panfletos voando ao vento como folhas secas.
Nos discursos, tanto dos sacerdotes quanto dos políticos, a palavra “esperança” é constante. O povo, que se ajoelha diante do altar em busca de alívio para suas dores e angústias, também se agarra às promessas eleitorais com a mesma intensidade. O pedido de saúde, emprego, e justiça se divide entre o céu e as urnas. O fervor que se vê nas procissões é o mesmo que impulsiona as discussões políticas nos bares e nas praças.
As casas simples, com suas fachadas enfeitadas para os festejos, também exibem cartazes de candidatos. Há uma certa devoção também na escolha dos futuros governantes. Muitos, ao sair da missa, discutem com entusiasmo sobre quem seria o verdadeiro “salvador” da cidade, o candidato capaz de fazer por Canindé o que São Francisco fez pelos pobres. E é assim que política e fé se tornam indissociáveis na vida de muitos, como se o santo e o político compartilhassem o mesmo poder de mudar destinos.
Nas barracas de comida, no comércio que floresce durante os festejos, o movimento é intenso. Os comerciantes, entre uma venda e outra, não deixam de lado a conversa sobre a eleição. Ali, entre uma tapioca e uma lembrança religiosa, se debate o futuro da cidade. A feira, que já é ponto de encontro de vozes e histórias, se transforma em palco de debates improvisados.
No fim do dia, quando o sol se põe e a cidade parece finalmente descansar, o clima de expectativa permanece no ar. O povo se recolhe, mas a inquietude fica. Em um mês onde se pede a intercessão divina e se deposita confiança no voto, Canindé vive dias intensos, onde a devoção a São Francisco se mistura com o anseio de um novo começo político.
O som das badaladas da Basílica se junta ao barulho das ruas, e o sentimento que fica é o mesmo de todo ano: entre a fé e a política, Canindé é uma cidade que não para de esperar, de sonhar, de acreditar.
3 Comentários
Parabéns amiga, você expressou toda verdade que os devotos amam.
Obrigada, querida amiga❤️
Cláudia, incrível a dualidade entre a fé e a as urnas capitada por sua sensibilidade. A crônica se torna muito atraente da forma que foi construída e também pela linguagem simples.
Parabéns!