A primeira atitude de seu Antônio Lopes de Siqueira, após ganhar sozinho o sorteio acumulado da maior loteria do país, foi dar um trato nos dentes. Dinheiro é o que não faltava. Afinal, mais de 200 milhões de reais, de uma hora para outra, foram parar nas suas mãos, por conta de uma aposta que lhe custou míseros cinco reais. Segundo cálculos matemáticos, ele foi um felizardo dentro de uma estatística, cuja probabilidade de ganhar o prêmio milionário é de 1 em mais 50 milhões! Neste caso, para quem já atravessara 73 janeiros e sempre levara uma vida modesta, parecia até uma brincadeira de mau-gosto do destino.
Os planos para aplicação de tão gorda bufunfa ainda sequer tinham sido traçados, a não ser um tratamento dentário em curso e, depois, a compra de uma casa. Dependendo do imóvel, certamente ainda lhe sobraria dinheiro para passar o resto da vida luxando de papo pro ar. Mas não.
Acontece que seu Antonio Lopes de Siqueira, 24 dias após a retirada do prêmio, foi fatalmente surpreendido pela “indesejada”, enquanto se achava sentado na cadeira do dentista, para um procedimento de implante. Morte súbita, segundo a polícia de Cuiabá, cidade onde o recém-milionário morava. Um inquérito foi aberto e as autoridades aguardam o resultado das circunstâncias do óbito.
A notícia da morte do mato-grossense Antonio Lopes de Siqueira bombou nos portais de internet do Brasil, causando espanto a muitos leitores e lamento a outro tanto. Eu diria mais lamento do que espanto. Pois, embora já septuagenário, o afortunado apostador poderia muito bem ainda usufruir do conforto e de tudo o que dinheiro em demasia permite. Mas a “indesejada das gentes”, no dizer do poeta Manuel Bandeira, não lhe permitiu colher os frutos da sorte. A morte aprontou com ele no momento mais incrível de sua vida.
Os adjetivos para a velhinha de foice em punho, escaveirada e vestida de preto, são inúmeros. Fria, indesejada, insidiosa, cruel, intransigente, covarde, justa, inevitável são apenas alguns, conforme a circunstância. No caso de seu Antonio Lopes de Siqueira, pode-se calcular que a morte foi uma velha traquina e trapaceira, que não lhe deu tempo sequer de dar aquele trato na mobília bucal e mostrar a todos por aí o sorriso mais feliz do mundo, próprio de um milionário. Ou talvez ele tenha tentado corrigir a tempo a falha dentária, unicamente pensando, talvez por ouvir dizer, na afirmativa do poeta Mario Quintana, segundo a qual, “A morte não iguala ninguém, pois há caveiras que não possuem todos os dentes”.
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