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Outro dia, em conversa com um amigo, este me dizia: “Confesso que já tenho é medo de entrar nas redes sociais, por conta de tanta coisa ruim que postam”. Concordei. É que nunca foi tão cômodo, como agora, o ofício de espalhar desgraça – claro, a desgraça alheia. O que antes era praticado oralmente, em tom de espanto e de fofoca, nas esquinas, nos bares, na barbearia, no banco da praça, agora é realizado instantaneamente, na palma da mão, para todo mundo ver. Isto porque, no aparelho celular estão reunidos todos os apetrechos necessários na propagação da notícia ruim, em tempo real: a fotografia, o vídeo e o áudio. Um atropelamento, e o cata-desgraça (assim chamemos tais personagens) marcha ao local, a qualquer hora, mesmo na madrugada, pressuroso, na ânsia de mostrar em primeira mão, em tudo que é rede social e demais canais da internet, as imagens do acontecido. Ali mesmo, do local do sinistro, muita vez perante um corpo mutilado ou as ferragens de um acidente brutal, ele está conectado para, sem perda de tempo, fazer o furo da tragédia.
O furo jornalístico, na imprensa praticada antes da era digital, foi sempre o trunfo mais almejado por repórteres do rádio e do jornal impresso. Fazer um furo era conquistar mais respeito e admiração entre os colegas e até galgar um degrau na profissão. Na chamada grande imprensa, os furos jornalísticos estão hoje, via de regra, relacionados a denúncias na seara política. Acontece que agora o mundo está repleto de “repórteres” improvisados, geralmente correios da má notícia, correspondentes da miséria alheia e dos acontecimentos escabrosos. São pessoas de todas as camadas, sem distinção alguma, uns mais afoitos no exercício de alardear, por meio da internet, a má notícia. Acidentes, incêndios, homicídios suicídios, afogamentos, espancamentos parecem ser os fatos da preferência dos correspondentes do mal.
Deve haver, na ciência da psicologia, algum recanto onde se explique o prazer que existe numa pessoa em propagar acontecimentos funestos, desde que estes não lhe pertençam nem a seus entes queridos. Aquelas disciplinas que se aplicam ao estudo das imperfeições mentais talvez expliquem que tara pode haver em se difundir, de modo pessoal, as escabrosidades, violências e aleijões no dia a dia da vida urbana.
O cata-desgraça, na sua peregrinação insaciável, na sua tara deplorável, não se comove perante a dor alheia, acima de tudo, quando a desgraça envolve pessoas vulneráveis, a exemplo de velhos e crianças. Isto porque, tais indivíduos devem ter “o coração de ferro e as entranhas de bronze”, a exemplo de Thanatus, o deus grego da morte. Na sua insânia desenfreada por visibilidade no mundo virtual, o cata-desgraça dá pouca importância aos ingredientes de uma informação honesta, quais sejam, os dados fundamentais da notícia. Assim, o mensageiro do mal torna-se o legítimo agente da informação precipitada – ou desinformação. O que tão-somente lhe interessa é ser o primeiro a provocar auê através da internet, custe o que custar à ética, ao sentimento alheio e à precisão da notícia transparente.
Pedro Paulo Paulino