© Pedro Paulo Paulino |
Entre as imagens mais atraentes da natureza, vi uma no meu quintal numa manhã deste ano: a floração do mandacaru. As flores brancas e puras se abriram ao longo dos pés do cacto, à semelhança de girassóis espalmados, acenando para a luz do dia. E logo uma multidão de abelhas e outros insetos rondavam aquelas pétalas voluptuosas, cheias de néctar e beleza. Depois os colibris e outros passarinhos cortejavam alegres as mesmas flores, numa orgia providencial, visto que toda essa fauna é responsável, entre outras coisas, pela proliferação do mandacaru dentro da caatinga.
Afora o vento, os insetos e as aves parecem ser os únicos seres privilegiados por tocar na brancura e no tecido imaculado das flores do mandacaru.
Guarnecendo cada pétala, fileiras e fileiras de espinhos altivos, como um exército invencível, perfilam-se e protegem-nas, como se protege um tesouro. Mesmo assim, por uma ordem natural, a flor do mandacaru ostenta seu encanto raro por apenas algumas horas. É comum desabrochar na madrugada e se recolher em si mesma com os primeiros raios de sol.
A floração termina aí e só se repetirá em outro ano. Esse espaço curto de tempo constitui um luxo na paisagem sertaneja. A propósito, na concepção do homem do campo, a floração do mandacaru está ligada à chegada da chuva, mesmo na estação mais desanimadora das secas. Por isso mesmo, o mandacaru inspirou uma das cantigas mais conhecidas de Luiz Gonzaga.
Ereto como colunas de um templo, os pés de mandacaru nascem, crescem e sobrevivem nos lugares mais inclementes, até mesmo sobre as rochas, telhados e muros. Conheço um que se equilibra no caule de uma algarobeira, vindo a ser o que os botânicos chamam de planta epífita. Geralmente, esses arbustos vivem isolados uns dos outros, como se fossem monólitos vegetais.
Para o semiárido, o mandacaru é um símbolo tal como o juazeiro. Na seca, é o aliado mais forte dos pequenos criadores. Levado ao fogo para eliminação dos espinhos, o mandacaru transforma-se em refeição salvadora do gado.
Nem mesmo a canícula mais devastadora embota o verde do mandacaru, que nos extremos da sequidão torna-se de um verde mais pujante ainda, como que se vingando do sol. E assim, em dado período do ano se transforma no mais varonil dos vegetais da caatinga, para em outra quadra ornamentar invejavelmente a paisagem com suas imensas flores brancas.
Foi num desses instantes, que no começo deste ano fotografei o pé de mandacaru do meu quintal. Ele amanheceu soberbo de flores. E eu o contemplei demoradamente, cheio de admiração. Afinal, nem todos somos míopes diante dos caprichos da Natureza.
Pedro Paulo Paulino