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    Home » FINS-D’ÁGUA

    FINS-D’ÁGUA

    Pedro Paulo PaulinoPor Pedro Paulo Paulino13/08/20244 Comentários3 minutos de leitura
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    ILUSTRAÇÃO/VALTER SILVA

    É assim que os cearenses chamamos o encerramento da quadra chuvosa, de janeiro a junho, quando não há seca. Eu não esperava encontra-la no Aurélio, mas eis que lá está, dicionarizada melo mestre do pai-dos-burros. “Bras. CE – O fim da época chuvosa, em junho”, sintetiza o léxico.

    Desmembrada a expressão, temos dois substantivos e uma preposição no meio, que no dicionário foram aglutinados e viraram um único substantivo masculino plural. Fins-d’água tem sua genealogia no nosso linguajar caboclo. É patrimônio do nosso cearencês. Brotou do espírito do povo, mestre em criar seus próprios verbetes e expressões, nos quais expressa todo o seu poder empírico de observação de tudo ao seu redor. E não há nada mais bonito do que ouvir de um raro sertanejo genuíno, imune a modismos, a sua fala espontânea de uma originalidade singular.

    O assunto veio à tona quando, no começo de junho, trocamos um dedo de prosa, eu e um amigo vizinho de cerca, camponês calejado e de muitos janeiros nas cacundas. O rumo da nossa conversa foi, por natureza, o inverno, pois nada há de mais imperativo no sertão do que a chuva. Ajeitando o chapéu de palha na cabeça embranquecida, assuntou: “Já tamo nos fins-d’água, o inverno tá pegando o beco. A lua nova num tá mais pendida e a estrela dalva tá pra se mudá pro poente. Mas num ai o que recramá, foi um inverno pai-d’égua, cumo fazia tempo que num se via”.

    Em poucas palavras, ele expôs uma série de observações essenciais, inclusive astronômicas. A lua nova inclinada, com as extremidades viradas para o norte, no começo de janeiro, na experiência matuta, é indicativa de chuvas. Vênus, que passa uma temporada visto no leste e outra no oeste, é também sinal de bom inverno quando brilha de manhã no nascente, recebendo o nome de estrela d’alva.    

    “O carreiro também num tá mais munto manchado”, complementou esse meu amigo e conterrâneo catingueiro. O carreiro da observação dele nada mais é que a Via Láctea, e as manchas, por certo, são os aglomerados estelares. Se variam de intensidade, a palavra é com os astrônomos. O certo é que, neste momento, tudo justifica que chegou mesmo o fins-d’água. Palavra sucinta, na qual cabe uma gama extraordinária de conceitos e efeitos, para enfatizar apenas um dos incontáveis vocábulos próprios de nós cearenses.

    E há ocasiões em que, como numa regressão verbal ao período de colonização, o nosso homem do sertão atreve-se, inconscientemente, a falar o português culto. Exemplo é quando diz barrer, bassoura, assobio, brabo, numa troca de fonemas que os filólogos chamam de betacismo. E para justificar a erudição linguística de nossa gente, basta (vasta) ouvir Camões, no primeiro verso de Os Lusíadas, falando-nos de uns “barões assinalados”, que no bom entendimento são “varões assinalados”, e dando-nos a garantia de que não há erro em se trocar, em tais ocorrências, o v pelo b.

    Nosso cearensês é mesmo um luxo linguístico. Ninguém, fora daqui, em todo esse mundão brasileiro, jamais concebeu palavra tão suficiente em si mesma, tão cabal e tão arretada, para dizer que o ciclo das chuvas terminou.

    Fins-d’água e tamo cunversado.

    Pedro Paulo Paulino
    • Local na rede Internet

    Atuante tanto na literatura de cordel quanto na poesia erudita, com diversas conquistas em prêmios literários de âmbito nacional. Além de seu trabalho como escritor, ele também é redator e diagramador de jornais, revistas e livros, atuando dentro e fora de Canindé. Como radialista, Pedro Paulo apresenta um programa aos domingos, focado em resgatar sucessos da Velha Guarda.

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    4 Comentários

    1. Manoel Severino Gonzaga Marreiro sobre 07/06/2024 5:32 pm

      O poeta Pedro Paulo Paulino atualizou a deixa de Manuel Bandeira, na quase centenária Evocação do Recife: ” O que fazemos/ é macaquear/ a sintaxe lusíada…”.
      E, exemplificando “a língua errada do povo/ a língua certa do povo “, textualiza a conhecença mais que secular do sertanejo.
      É por esta e outras que ouso afirmar que as prosas em versos e os versos de prosa do autor devem ser garimpados na ganga impura campesina.

      Responder
      • Pedro Paulo Paulino sobre 08/06/2024 2:06 pm

        A “ganga impura campesina” é ótima, meu amigo Dr. Severino. Obrigado pela leitura e comentário da crônica.

        Responder
    2. Pedro Gervásio Moreira Martins sobre 07/06/2024 7:29 pm

      Texto de marca registrada de um nordestino raiz, que descreve o nosso sertão com um sentimento de pertecimento que só poeta de muita sensibilidade poderia escrever; me enche de saudade do nosso Canindé. Em tempos idos ouví essa pequena palavra pra descrever o fim da quadra invernos, muitas com uma corruptela ” firn d’água ” como a pergunta, quando será o casamento? No firns d’água .

      Responder
    3. Pedro Paulo Paulino sobre 08/06/2024 2:07 pm

      Dr. Pedro, vc acrescentou um detalhe muito curioso: o casório no fins-d’água. Ninguém imita nossa gente. Abraços e obrigado pelas considerações!

      Responder

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