Foto: Garapa – Coletivo Multimídia / Wikimedia Commons. |
A Academia Brasileira de Letras acaba de eleger seu mais novo integrante: o ambientalista, filósofo e líder indígena Ailton Krenak. Aos 70 anos, Krenak é o primeiro indígena a tomar parte nos quadros da ABL, ocupando a cadeira número 5, já por si uma cadeira com valor histórico, pois pertenceu à cearense Rachel de Queiroz, primeira mulher a ingressar nessa renomada confraria.
Na disputa pela vaga, Krenak obteve 23 votos, contra 12 da historiadora Mary del Priore e 4 de outro candidato indígena. Embora não cultive o hábito da escrita, o novo imortal, nascido na região mineira do vale do rio Doce, teve reconhecidos seus méritos como ativista socioambiental e sua trajetória em defesa dos direitos indígenas, em sua ampla dimensão.
O fato de não ser propriamente um escritor, no sentido lato dessa palavra, não traz demérito algum para Ailton Krenak, levando em conta a importância de seu trabalho em prol da preservação da cultura indígena, costumes e tradições, e também sua batalha em favor do meio ambiente. Além do que, a ABL há muito tempo contabiliza em sua lista de imortais nomes como Barão do Rio Branco, Santos Dumont e Oswaldo Cruz, que se projetaram nacional e internacionalmente em outras áreas bem diversas da atividade literária.
A inclusão ou não de acadêmicos sem muita afinidade com os meandros intelectuais remonta aos primórdios da instituição. Machado de Assis e Joaquim Nabuco, dentre os fundadores da ABL, já divergiam no debate. A opinião de Nabuco prevaleceu. Ele defendia um conceito mais abrangente de “humanidades”, sem exclusividade para as letras.
E mesmo no campo estrito das letras, críticas se levantam em torno da ABL, quando essa instituição abriga vultos sem clara expressão no manejo da escrita, em detrimento de escritores consagrados que não figuram entre os imortais: Érico Veríssimo, Graciliano Ramos e Carlos Drummond de Andrade, por exemplo, não adentraram os portões da ABL.
De tal modo que, sob nossa perspectiva, é digna de aplauso a eleição de Ailton Krenak para envergar o fardão de imortal. Embora o líder indígena não seja um artífice das letras, pesa em seu favor sua bagagem de ambientalista mestre na linguagem da natureza, filósofo e poeta autêntico, compromissado sempre com a preservação da fauna e da flora. Em tudo isso, Krenak deve levar mais vantagem, só para exemplificar, que seu colega acadêmico Zé Sarney, que faz tempo entrou para a ABL, tendo como esteio literário sua obra sem relevo, em cujo repertório aparece o chamuscado e burlesco título Marimbondos de fogo.
Pedro Paulo Paulino