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A imprensa noticiou esta semana um caso, no mínimo, sui-generis em matéria de sorte. Um apostador da cidade de Cajazeiras, na Paraíba, acertou as seis dezenas da loteria que sorteou centenas de milhões de reais na virada do ano. Acertou e perdeu. Unicamente porque a aposta não foi encerrada. A mãe do pequeno Pedro Henrique pediu ao filho, de apenas dez anos, que marcasse seis dezenas no bilhete da Mega-Sena. Pedro marcou 04, 05, 10, 34, 58, 59. Batata! À noite, foram exatamente esses os numerais sorteados. Mas Pedro perdeu, pois a aposta, simplesmente, não foi concluída. Por um descuido de dona Linda Inês, a mãe de Pedro, a família deixou de embolsar a bufunfa de mais de cem milhões de reais.
Logo ela, que diz ter sonhado na véspera que ganharia o prêmio milionário. Mas como, no sonho, não vislumbrou os números, durante o dia recorreu ao palpite do pequeno Pedro, que pela primeira vez na vida marcou um bilhete de loteria, e logo na estreia quase fica milionário. Segundo a notícia, dona Inês já teria ido à agência lotérica fazer suas apostas. De volta, trouxe novos bilhetes em branco, e um deles foi justamente o que teve as dezenas escolhidas pelo filho – as dezenas sorteadas.
A impressão do que chamamos sorte está estritamente ligada ao acaso, e o acaso, por sua vez, é fortuito, incerto e inesperado. No caso de dona Linda Inês, a sorte bateu-lhe à porta enquanto ela dormia. De manhã, não recordou os números com que sonhou. Entra em cena Pedro, o filho, em sua ingenuidade de quem tem dez anos. Depois, a displicência da mãe, que não voltou à lotérica e, quando tentou jogar pela internet, não conseguiu. Mais tarde, a surpresa e a decepção, tendo em mãos o bilhete premiado, mas inválido.
Ganhar e não ganhar a um só tempo, eis uma questão difícil de engolir. Saber que a sorte, trazendo a fortuna, bateu à porta e a porta não foi aberta, deve ser um sentimento amargo de remorso e culpabilidade imperdoável. Principalmente quando a sorte é entregue através das mãos de um filho de dez anos. Mas, ainda segundo a notícia, dona Linda Inês conformou-se e, como quase todo mundo costuma fazer quando não resta mais o que fazer, ela simplesmente desculpou-se: “Foi a vontade de Deus, né?”.
Não sei se foi. Prefiro crer que mais deve ter sido a falta de vontade dela. Pois não fora isso, estavas, Linda Inês, posta em sossego, colhendo os doces frutos da fortuna. E tu, pequeno Pedro, também. No entanto, talvez seja melhor para ti, Pedro, cresceres de acordo com tuas condições de origem, buscando no estudo e no trabalho futuro o ganho suado da vida. E tendo consciência de que a sorte nem sempre bate à porta, como tão cedo bateu à tua porta, que não foi aberta.
Pedro Paulo Paulino