Fiquei pra lá de contente quando descobri o nome daquela árvore majestosa que sempre me prendeu o olhar. De grande porte, tronco robusto, copa altaneira e frondosa, raízes vigorosas fincadas no chão como garras de um gigante, ela se distingue ao longe do conjunto da flora de uma cidade cravada no meio do sertão. Não faz muito tempo, indaguei a um desconhecido de cabelos brancos, que avistei recostado no tronco da árvore e usufruindo a sua sombra, se ele sabia o nome dela. Disse-me, quase resmungando, que a conhece há pelo menos uns cinquenta anos, sem lhe saber o nome nem quem a plantou, e sem também nunca ter tido a preocupação de saber tais coisas.
Porém, tudo a seu tempo, como se diz. Pois ocorre que, dia desses, um amigo internauta, também admirado da presença do exótico vegetal na cidade, publicou em uma rede social a certidão de nascimento da emblemática árvore. Trata-se, em verdade, de um pé de Samaúma, seu nome em tupi. É também chamada de Ocá e Mafumeira. E mais: apurou, pela voz de populares, que ela foi plantada em 1958, não se sabe por quem.
A informação atiçou-me cada vez mais a curiosidade. E assim fiquei sabendo que a Samaúma é uma planta tropical nativa do México, espalhada pela América do Sul, predominando na floresta amazônica, onde tem diversos apelidos: “A Gigante da Amazônia”, “Rainha da Floresta”, “Árvore da Vida” e “Árvore Mãe”. Esta última alcunha tem sua razão de ser. A Samaúma, sozinha, pode pôr em prática a solidariedade que muitos humanos apenas apregoam, uma vez que, além de ser abrigo de incontáveis pássaros e insetos, ela protege árvores menores sob sua copa, e, o mais incrível: em certos períodos, quando as raízes atingem um determinado nível de umidade, a árvore solta o excesso de água e irriga outras plantas ao seu redor! Ou seja, aquilo que sempre falamos da boca pra fora, de compartilhar o pão, a água etc.
Tem mais: “Em outros tempos, a Samaúma foi considerada o ‘telefone da floresta’. Golpeadas suas enormes raízes, o som ecoa por longas distâncias. Por isso ela era um meio de comunicação para os povos indígenas, com mensagens elaboradas através de uma espécie de Código Morse”. Com essa lista de predicados admiráveis, não é à toa que a Samaúma já era cultuada como árvore sagrada pelas civilizações pré-colombianas, que a chamavam de “Escada do Céu”.
E ali está ele, o pé de Samaúma da cidade, plantado na esquina onde a rua João Pinto Damasceno encontra a rua Raimundo Alcoforado, duas das artérias de maior movimentação no Centro de Canindé, sertão do Ceará. Ali está ela, a Samaúma, nem tão velha nem tão jovem, melhor dizendo, em sua meia vida, que pode alcançar os 120 anos. Ali está ela, sobranceira, altiva, galharda, farfalhando suas folhas erguidas muito acima do asfalto, por onde, sob seu olhar generoso, passam a todo instante os transeuntes indiferentes a ela, e por onde, a todo instante, passa também o ronco dos motores, soltando gás carbônico para ela transformar em oxigênio e nos devolver prontamente.
Ali está ela, a Samaúma da cidade, solitária, anônima, oferecendo sua seiva a outros seres vivos e sombra aos homens, perdida entre dezenas de outras espécies vegetais, porque ela é filha única neste meio de mundo, sem conhecidos nem parentes. Por sorte, fica localizada no principal corredor de acesso ao templo franciscano, e deve ser por isto que, ali, ela está protegida até agora da fúria da motosserra, que não faz muito tempo, por ordem da gestão municipal, fez um passeio devastador por uma importante avenida de Canindé, botando abaixo dezenas de árvores acolhedoras, num dos setores mais tórridos desta comuna, cujo cartão-postal abstrato é o calor. E agora que sei teu nome, árvore tão bela e galante, ficamos mais amigos. E é por ti que rogo a Francisco, o santo adorador da natureza, que defenda, da fúria e da maldade, o pé de Samaúma da cidade!