A entrega do Oscar em 2025 agitou o mundo e, em particular, o Brasil, que pela primeira vez tem uma produção cinematográfica premiada com a celebrada estatueta. Ainda estou aqui, filme de sucesso, originado de livro do mesmo nome, foi o pioneiro nacional na categoria Melhor Filme Internacional. Fenômeno de mídia, a expectativa em torno do longa-metragem, nos dias mais recentes, crescia à medida em que se aproximava a data da cerimônia de outorga da maior premiação do gênero, pela Academia de Artes e Ciências Cinematográficas sediada no Norte da América.
E desde que se diz que por aqui tudo acaba em samba, a empolgante cerimônia de entrega do Oscar aconteceu em plena segunda noite do Carnaval brasileiro, que misturou uma coisa com a outra, fazendo com que a estatueta tão disputada ganhasse réplica nas mãos de foliões que comemoram o evento mundial em todos os recantos do país, muitos fantasiando-se de atores protagonistas do filme, e fazendo, de fato, aquele carnaval em torno do assunto, em bares, clubes, praças e sambódromos, num autêntico glamour de final de Copa do Mundo, com o Brasil na decisão.
Como assistente na plateia virtual, enquanto o show acontecia, pus-me a perguntar quando, depois do primeiro Oscar, o Brasil será agraciado com o primeiro Prêmio Nobel em toda a história do Nobel e do Brasil.
Até hoje, pelo que se contabiliza, pelo menos 40 personagens brasileiros tiveram seus nomes sugeridos ao rígido comitê da Fundação Nobel, em sua maioria, talentos que se projetaram na literatura nacional e também na medicina e em práticas ligadas à paz.
Limitando-se ao campo da medicina, salta em primeiro lugar o nome do paulistano Manoel Dias de Abreu, inventor da abreugrafia, um método rápido e barato para o diagnóstico precoce da tuberculose, e que já ajudou a salvar milhares de vidas. Ele recebeu seis indicações para o Nobel de Fisiologia e Medicina, sem nunca ter sido laureado.
Na mesma categoria, aparece o nome do médico sanitarista mineiro Vital Brazil, criador dos Institutos Butantan e Vital Brazil, além de descobridor dos soros antipeçonhento e antiofídico, um milagre da ciência que salva número incontável de vidas. No mesmo rastro, surgem os nomes do carioca Adolf Lutz, pai da medicina tropical, e do paulista Oswaldo Cruz, guerreiro incansável na campanha de vacinação contra a varíola.
Todos os nomes citados até agora ganharam fama e reconhecimento internacional, menos o Prêmio Nobel. De todos eles, entretanto, o vulto brasileiro que gerou mais polêmica, aqui e no exterior, foi o cientista, também mineiro, Carlos Ribeiro Justiniano das Chagas, ou, simplesmente, Carlos Chagas. Médico sanitarista com admirável lastro de atuação na área, ele teve o mérito de ser o primeiro, e até os dias atuais, único cientista na história da medicina a descrever completamente o ciclo de uma doença infecciosa: o causador, o transmissor, os hospedeiros, as manifestações clínicas e a epidemiologia. Só não descobriu a cura porque, enfim, até hoje o mal de Chagas continua fazendo vítimas.
A descoberta de Chagas foi reconhecida no país e no exterior como uma das mais importantes conquistas da parasitologia. E por que o Nobel não veio parar nas mãos do famoso cientista brasileiro, duas vezes indicado? Há controvérsias e controvérsias. Oposição de colegas cientistas, tocado pelo veneno da inveja, é uma delas. O mais plausível, no entanto, deve ter sido o olhar sempre excludente do Comitê do Nobel, vidrado em cientistas europeus e norte-americanos e vendado para o resto do mundo.
Em compensação, em vez do prêmio sueco, festejamos a glória da conquista, pela primeira vez, da estatueta mundial do cinema. “Agora o Oscar é nosso”, é o que se disse com orgulho no quente da festa. Desta feita, a bola cedeu lugar para a Sétima Arte, e o Brasil foi buscar lá fora algo além da taça Jules Rimet, conquistada no tricampeonato mundial de 70 e roubada para sempre em 1983. Portanto, muito cuidado com a estatueta, Walter Salles!